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domingo, 20 de janeiro de 2013

20-01-1955

Aniversário
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos, 
Eu era feliz e ninguém estava morto. 
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos, 
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer. 

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos, 
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma, 
De ser inteligente para entre a família, 
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim. 
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças. 
Quando vim a.olhar para a vida, perdera o sentido da vida. 

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo, 
O que fui de coração e parentesco. 
O que fui de serões de meia-província, 
O que fui de amarem-me e eu ser menino, 
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui... 
A que distância!... 
(Nem o acho... ) 
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos! 

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa, 
Pondo grelado nas paredes... 
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas), 
O que eu sou hoje é terem vendido a casa, 
É terem morrido todos, 
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio... 

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos ... 
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo! 
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez, 
Por uma viagem metafísica e carnal, 
Com uma dualidade de eu para mim... 
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes! 

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui... 
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos, 
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado, 
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa, 
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos... 

Pára, meu coração! 
Não penses! Deixa o pensar na cabeça! 
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus! 
Hoje já não faço anos. 
Duro. 
Somam-se-me dias. 
Serei velho quando o for. 
Mais nada. 
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira! ... 

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!... 

Álvaro de Campos, in "Poemas" 
Heterónimo de Fernando Pessoa

12 comentários:

Hermínia Nadais disse...

Não conhecia este poema! É maravilhoso!

Laços e Rendas de Nós disse...


E PARABÉNS!

Beijinhos

Laura

Célia disse...

Em primeiro lugar, PARABÉNS! Vida é para se comemorar sempre! E, depois, parabenizá-lo pela bela escolha do poema de Pessoa! Seja muito feliz!
Abraço, Célia.

Maria Rodrigues disse...

Excelente escolha, belissimo poema.
Também eu gostava tanto de comemorar o meu aniversário, hoje é apenas mas um dia.
Embora com atraso deixo os meus parabéns.
Bos semana
Beijinhos
Maria

Unknown disse...

Hermína,grato pela visita,volte sempre que queira a casa é sua.

Bjo.

Beth/Lilás disse...

E hoje é o dia dos seus anos, junto-me a bela poesia de F.Pessoa para enviar-lhe um forte abraço e o desejo de que seus dias sejam sempre iluminados com a poesia que lhe brota d'alma.
Feliz Aniversário querido Manuel!
beijos cariocas


pensandoemfamilia disse...

Parabéns pelo seu dia; não conhecia esse poema
de Pessoa.
Eu sempre gostei de comemorar meu aniversário e assim continua, Para mim é um dia especial . marco da existência.
bjs

Rita Freitas disse...

Lindo como só Fernando Pessoa consegue.

E parabéns (atrasados) :)

bjinhos

Anónimo disse...

perfeita sua escolha....


um grd e afetuoso abraço...




Zil

Sónia M. disse...

Este poema é excelente! Já conhecia.

Parabéns Manuel, desculpe o atraso, mas mais vale tarde que nunca :)

Um beijo e um forte abraço
Sónia

Reflexos Espelhando Espalhando Amig disse...

Que seu dia tenha sido
um dia Importante
feliz.
Amo meus 50 dias de aniversario.
Bjins
Catiaho Reflexo d'Alma

MARILENE disse...

Esse poema é maravilhoso. A nostalgia não tira seu brilho. Abraços!