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terça-feira, 13 de outubro de 2009
Inconfesso Desejo .
Queria ter coragem
Para falar deste segredo
Queria poder declarar ao mundo
Este amor
Não me falta vontade
Não me falta desejo
Você é minha vontade
Meu maior desejo
Queria poder gritar
Esta loucura saudável
Que é estar em teus braços
Perdido pelos teus beijos
Sentindo-me louco de desejo
Queria recitar versos
Cantar aos quatros ventos
As palavras que brotam
Você é a inspiração
Minha motivação
Queria falar dos sonhos
Dizer os meus secretos desejos
Que é largar tudo
Para viver com você
Este inconfesso desejo
Carlos Drummond de Andrade
Coisas.
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Alarga os Teus Horizontes .
Por que é que combateis? Dir-se-á, ao ver-vos,
Que o Universo acaba aonde chegam
Os muros da cidade, e nem há vida
Além da órbita onde as vossas giram,
E além do Fórum já não há mais mundo!
Tal é o vosso ardor! tão cegos tendes
Os olhos de mirar a própria sombra,
Que dir-se-á, vendo a força, as energias
Da vossa vida toda, acumuladas
Sobre um só ponto, e a ânsia, o ardente vórtice,
Com que girais em torno de vós mesmos,
Que limitais a terra à vossa sombra...
Ou que a sombra vos torna a terra toda!
Dir-se-á que o oceano imenso e fundo e eterno,
Que Deus há dado aos homens, por que banhem
O corpo todo, e nadem à vontade,
E vaguem a sabor, com todo o rumo,
Com todo o norte e vento, vão e percam-se
De vista, no horizonte sem limites...
Dir-se-á que o mar da vida é gota d'água
Escassa, que nas mãos vos há caído,
De avara nuvem que fugiu, largando-a...
Tamanho é o ódio com que a uns e a outros
A disputais, temendo que não chegue!
Homens! para quem passa, arrebatado
Na corrente da vida, nessas águas
Sem limites, sem fundo - há mais perigo
De se afogar, que de morrer à sede!
De que vale disputar o espaço estreito,
Que cobre a sombra da árvore da pátria,
Quando são vossos cinco continentes?
De que vale apinhar-se junto à fonte
Que - fininha - brotou por entre as urzes,
Quando há sete mil ondas por cada homem?
De que vale digladiar por uma fita,
Que mal cobre um botão, quando estendida
Deus pôs sobre a cabeça de seus filhos
A tenda, de ouro e azul, do firmamento?
De que vale concentrar-se a vida toda
Numa paixão apenas, quando o peito
É tão rico, que basta dar-lhe um toque
Por que brotem, aos mil, os sentimentos?!
Oh! a vida é um abismo! mas fecundo!
Mas imenso! tem luz - e luz que cegue.
Inda a águia de Patmos - e tem sombras
E tem negrumes, como o antigo Caos:
Tem harmonias, que parecem sonhos
De algum anjo dormido; e tem horrores
Que os nem sonha o delírio!
É imensa a vida,
Homens! não disputeis um raio escasso
Que vem daquele sol; a ténue nota,
Que vos chega daquelas harmonias;
a penumbra, que escapa àquelas sombras;
O tremor, que vos vem desses horrores.
Sol e sombras, horror e harmonias
De quem é isto, se não é do homem?!
Não disputeis, curvado o corpo todo,
As migalhas da mesa do banquete:
Erguei-vos! e tomai lugar á mesa...
Que há lugar no banquete para todos:
Que a vida não é átomo tenuíssimo,
Que um feliz apanhou, no ar, voando,
E guardou para si, e os outros, pobres,
Deserdados, invejam - é o ar todo,
Que respiramos; e esse, inda mais livre,
Que nos respira a alma - a terra firma.
Onde pomos os pés, e o céu profundo
Aonde o olhar erguemos - é o imenso,
Que se infiltra do átomo ao colosso;
Que se ocultou aqui, e além se mostra;
Que traz a luz dourada, e leva a treva;
Que dá raiva às paixões, e unge os seios
Com o bálsamo do amor; que ao vício, ao crime,
Agita, impele, anima, e que à virtude
Lá dá consolações - que beija as frontes
De povo e rei, de nobre e de mendigo;
E embala a flor, e eleva as grandes vagas;
Que tem lugar no seio, para todos;
Que está no rir, e está também nas lágrimas,
E está na bacanal como na prece!...
Antero de Quental, in 'Odes Modernas - Vida'
domingo, 11 de outubro de 2009
A Carne é Fraca .
Então, passeando excitado pelo quarto, levava as suas acusações mais longe, contra o Celibato e a Igreja: porque proibia ela aos seus sacerdotes, homens vivendo entre homens, a satisfação mais natural, que até têm os animais? Quem imagina que desde que um velho bispo diz - serás casto - a um homem novo e forte, o seu sangue vai subitamente esfriar-se? E que uma palavra latina - accedo - dita a tremer pelo seminarista assustado, será o bastante para conter para sempre a rebelião formidável do corpo? E quem inventou isso? Um concílio de bispos decrépitos, vindos do fundo dos seus claustros, da paz das suas escolas, mirrados como pergaminhos, inúteis como eunucos! Que sabiam eles da Natureza e das suas tentações? Que viessem ali duas, três horas para o pé da Ameliazinha, e veriam, sob a sua capa de santidade, começar a revoltar-se-lhes o desejo! Tudo se ilude e se evita, menos o amor! E se ele é fatal, porque impediram então que o padre o sinta, o realize com pureza e com dignidade? É melhor talvez que o vá procurar pelas vielas obscenas! - Porque a carne é fraca!
Eça de Queirós, in 'O Crime do Padre Amaro'
Distância.
"É fácil trocar as palavras,
Difícil é interpretar os silêncios!
É fácil caminhar lado a lado,
Difícil é saber como se encontrar!
É fácil beijar o rosto,
Difícil é chegar ao coração!
É fácil apertar as mãos,
Difícil é reter o calor!
É fácil sentir o amor,
Difícil é conter sua torrente!
Como é por dentro outra pessoa?
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Com que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro entendimento.
Nada sabemos da alma
Senão da nossa;
As dos outros são olhares,
São gestos, são palavras,
Com a suposição
De qualquer semelhança no fundo."
Fernando Pessoa
sábado, 10 de outubro de 2009
Dois Amantes, o Mundo .
dois amantes, o mundo
cada um no seu reino, beijam-se nas praias
quando as ondas batem as areias
o mar é o meu navio,
hoje naufrago feliz
8sabes quem sou, as dunas
que se levantam com o vento são
os sonhos do amor que dormita
em sossego nas praias
a terra és tu o mar sou eu
Jorge Reis-Sá, in "A Palavra no Cimo das Águas"
(A uma pessoa especial)
Solidão...
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Anos 70/80/90
As recordações não povoam a nossa solidão, como se costuma dizer; antes pelo contrário, tornam-na mais profunda ...
Beijo .
Beijo na face
Pede-se e dá-se:
Dá?
Que custa um beijo?
Não tenha pejo:
Vá!
Um beijo é culpa,
Que se desculpa:
Dá?
A borboleta
Beija a violeta:
Vá!
Um beijo é graça,
Que a mais não passa:
Dá?
Teme que a tente?
É inocente...
Vá!
Guardo segredo,
Não tenha medo...
Vê?
Dê-me um beijinho,
Dê de mansinho,
Dê!
*
Como ele é doce!
Como ele trouxe,
Flor,
Paz a meu seio!
Saciar-me veio,
Amor!
Saciar-me? louco...
Um é tão pouco,
Flor!
Deixa, concede
Que eu mate a sede,
Amor!
Talvez te leve
O vento em breve,
Flor!
A vida foge,
A vida é hoje,
Amor!
Guardo segredo,
Não tenhas medo
Pois!
Um mais na face,
E a mais não passe!
Dois...
*
Oh! dois? piedade!
Coisas tão boas...
Vês?
Quantas pessoas
Tem a Trindade?
Três!
Três é a conta
Certinho, e justa...
Vês?
E que te custa?
Não sejas tonta!
Três!
Três, sim: não cuides
Que te desgraças:
Vês?
Três são as Graças,
Três as Virtudes;
Três.
As folhas santas
Que o lírio fecham,
Vês?
E não o deixam
Manchar, são... quantas?
Três!
João de Deus, in 'Campo de Flores'
Literatura.
Sinopse:
Kitty e Louise Heaney despedem-se dos respectivos namorados, Julian e Michael, que vão combater na Segunda Guerra Mundial.
As irmãs Heaney sentam-se à mesa da cozinha, todas as noites, para escrever cartas: Louise, ao noivo; Kitty, ao homem de quem anseia ardentemente receber um pedido de casamento; e a terceira, Tish Heaney, a um grupo de homens, sempre diferente, que ela vai conhecendo nos bailes da United Service Organization.
Nas cartas que as irmãs enviam e recebem, há imagens fugazes e íntimas da vida, tanto na frente de batalha, como em casa.
Para Kitty, uma jovem confiante e voluntariosa, a partida do namorado e as lições que aprende sobre amor, resistência e guerra trarão uma surpresa e revelarão um segredo, levando-a a uma acção radical em nome das pessoas que ama, que transformará para sempre a família Heaney.
As consequências perenes das escolhas que as irmãs fazem são o centro deste magnífico romance sobre o poder do amor e a força duradoura da família
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
A vida é o dia de hoje
A vida é o dia de hoje,
A vida é ai que mal soa,
A vida é sombra que foge,
A vida é nuvem que voa;
A vida é sonho tão leve
Que se desfaz como a neve
E como o fumo se esvai:
A vida dura um momento,
Mais leve que o pensamento,
A vida leva-a o vento,
A vida é folha que cai!
A vida é flor na corrente,
A vida é sopro suave,
A vida é estrela cadente,
Voa mais leve que a ave:
Nuvem que o vento nos ares,
Onda que o vento nos mares,
Uma após outra lançou,
A vida - pena caída
Da asa da ave ferida
De vale em vale impelida
A vida o vento levou!
João de Deus
Amor Platônico.
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Timidez .
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve. . .
— mas só esse eu não farei.
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes..
— palavra que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,
— que amargamente inventei.
E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...
— e um dia me acabarei.
Cecília Meireles, in 'Viagem'
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